Stanley Kubrick – Vida e Obra
Coé Geeks, beleza?
Hoje é dia 26 de julho e, se estivesse vivo, Stanley Kubrick estaria completando 91 anos. E que forma melhor de celebrar seu legado além de fazendo um apanhado sobre sua vida e obra?
Bora lá!
Stanley Kubrick nasceu nos Estados Unidos em 26 de julho de 1928, filho de um casal de judeus (apesar dele mesmo se declarar ateu) de classe média alta. Viveu sua infância e adolescência no Bronx e apesar de muito inteligente nunca demonstrou interesse nos estudos, seu negócio mesmo eram as artes. Desde muito cedo se interessava por literatura e fotografia, chegando até a trabalhar por alguns anos como fotógrafo na revista Look, antes de se voltar para a sua real paixão: o cinema.
Stanley foi casado 3 vezes: Primeiro com sua namorada da época da escola, Toba Metz, num casamento que durou apenas 3 anos; Depois com a dançarina e produtora teatral Ruth Sobotka, num relacionamento de 5 anos onde Ruth fez uma participação em seu filme “A Morte Passou por Perto” (1955) e foi diretora de arte do filme seguinte, “O Grande Golpe” (1956); e por último com Christiane Harlan (que veio a se tornar Christiane Kubrick), de 1958 até sua morte, após conhece-la no set de seu filme “Glória Feita de Sangue” (1957), e juntos tiveram 2 filhas, Anya e Vivian, além de Katherina, filha de Christiane de um relacionamento anterior.
Durante seus últimos anos de vida Stanley se tornou recluso e parou de dar entrevistas. Isso causou uma situação no mínimo peculiar: Um homem chamado Alan Conway começou a se passar por ele, prometendo emprego a atores e atrizes iniciantes, comendo em restaurantes caros às custas “do seu estúdio” e confundindo até mesmo os amigos pessoais dos Kubrick. Enquanto Stanley ficou encantado e se divertiu com a história, sua esposa Christiane ficou horrorizada e o mais legal é que existe um filme de comédia chamado Totalmente Kubrick (2005) com John Malkovich no papel de Conway!
Outra coisa muito interessante envolvendo Stanley Kubrick é a ideia de que ele havia ajudado a encenar toda a ida do homem à lua. Essa é uma teoria da conspiração bem conhecida e vocês podem ler mais clicando aqui!
Stanley Kubrick dirigiu 13 filmes e 3 curtas em 48 anos de carreira, além de servir como “produtor póstumo” no filme AI – Inteligência Artificial (2001) de Steven Spielberg, já que o projeto original era dele. Seus filmes foram indicados ao Oscar (27 indicações e 9 vitórias), ao BAFTA (30 indicações e 10 vitórias), ao Globo de Ouro (18 indicações e 2 vitórias), ganhou 3 Hugo Awards (um prêmio ao melhor trabalho em ficção científica ou fantasia) por Dr. Fantástico (1954), 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968) e Laranja Mecânica (1971), além de inúmeras premiações em festivais de cinema pelo mundo.
Conhecido por ser EXTREMAMENTE perfeccionista em seus trabalhos, ele acabava por se tornar o “terror” dos atores. Jack Nicholson, que trabalhou com Stanley em “O Iluminado” (1980) disse que chegou a repetir a mesma cena mais de 50 vezes até que ela ficasse ao gosto do diretor. Apesar dessa quase obsessão, a grande maioria dos atores que trabalhou com ele ficava maravilhada com seus métodos e com seu quase paternalismo, sempre ajudando os atores na criação de seus personagens. Houve apenas um ator que jurou nunca mais trabalhar com Kubrick: o astro Kirk Douglas (pai do ator Michael Douglas), personagem principal dos filmes Glória Feita de Sangue (1957) e Spartacus (1960), não teve muitos problemas na primeira colaboração, mas ao assumir a produção executiva de Spartacus teve o famoso “choque de monstro” com Stanley. Acho que a briga de egos foi pesada demais e os dois terminaram o filme, que foi um sucesso estrondoso, odiando um ao outro.
Esse perfeccionismo de Kubrick é responsável por entregar filmes belíssimos e muito bem projetados. Em cada filme quase que é possível enxergar o diretor obcecado, debruçado sobre as horas e horas de imagens gravadas, escolhendo os melhores takes e colaborando na edição até ficar do jeito que ele quer. Por ter experiencia prévia como fotógrafo ele sabia exatamente como iluminar e posicionar uma cena, transformando a fotografia de seus filmes em uma experiência única.
Grande parte de seus filmes contavam com um jogo de câmera conhecido como “One Point Perspective” (que pode ser traduzida como “Perspectiva de ponto único”), onde toda a cena é alinhada de forma que se crie uma espécie de visão afunilada, onde seus olhos são quase que obrigados a se focar em um ponto específico bem no meio da tela. Dá pra ver melhor no vídeo abaixo (que eu indicaria que vocês diminuíssem o som porque quase fiquei surda com a trilha sonora):
Existem duas técnicas que Kubrick ajudou a perpetuar no cinema e são elas o chamado “Travelling”, onde a câmera vai acompanhando os movimentos dos personagens (e no caso de Kubrick, algumas vezes a câmera também se torna o personagem e passamos a ver as cenas pelos olhos do protagonista) e o “Zoom Shot”, quando a cena começa fechada em um personagem e depois vai se afastando para mostrar a cena completa desenrolando ao redor. Apesar desse método ser comum hoje, ele foi usado provavelmente pela primeira vez no seu filme de 1975 “Barry Lyndon”, com lentes caríssimas compradas da NASA que renderam o Oscar de Fotografia e o BAFTA de diretor, mas que não foram o suficiente para transformar o filme num sucesso de crítica.
É incrível como o Travelling é usado com maestria desde os primeiros filmes de Kubrick, datados do final dos anos 50, numa época em que não haviam tantos recursos disponíveis como temos agora. O cara era um gênio e eu trouxe mais um videozinho pra ilustrar esse movimento de câmera, que meio que pode ser considerada a marca registrada dele (uma pena que a qualidade das imagens esteja ruim e que também tenha uma música meio incoerente com a ideia do vídeo):
Outra constante em seus filmes é o “Voice-over”, onde ou o personagem principal ou um narrador onipresente vão comentando o desenrolar da história para o telespectador. Apesar de alguns críticos acreditarem que essa é uma forma fácil e preguiçosa de se resolver problemas na hora de adaptar um livro pro cinema (coisa que Kubrick fez em 11 de seus 13 filmes), esses voice-overs se encaixam perfeitamente com o tom imersivo que Kubrick gosta de apresentar. Você se sente parte da história, torce pelos personagens e se encanta com eles.
Sua arte, sua técnica, sua mente criativa e seu perfeccionismo foram responsáveis por influenciar trocentos diretores famosos, que o viam como uma espécie de fonte de inspiração. Entre os mais famosos posso citar Steven Spielberg, Wes Anderson (que inclusive é muito conhecido por se atentar à simetria de seus filmes), James Cameron, Martin Scorcese e Christopher Nolan.
Para escrever esse texto eu assisti todos os filmes, inclusive os que já tinha visto antes. Foi demorado, visto que a maioria de seus filmes tem mais de 2 horas, mas foi uma experiência enriquecedora, de verdade. Indico vocês a fazerem o mesmo em menos de 1 semana igual a mim? Não kkkkkkkkkk
Anos 50:
(Os dois primeiros filmes foram os únicos cuja ideia original foi a de Kubrick, e também foram os que eu mais tive dificuldade de curtir porque eles simplesmente não envelheceram tão bem quanto os outros. Parece que o grande dom do Kubrick era recontar histórias ao invés de criá-las)
“Medo e Desejo” (1953) é ambientado numa guerra fictícia e mostra a forma como ela afeta os personagens de diferentes formas. É um filme potente e já mostrava o antibelicismo que acompanharia o diretor em todos os outros filmes.
“A Morte Passou por Perto” (1955) é uma história meio confusa sobre um boxeador fracassado que se apaixona por sua vizinha misteriosa e esse romance quase custa sua vida. Os diálogos e as atuações são bem caricatos e algumas características do cinema da época (as paixões fulminantes que se desenrolam no correr de apenas 2 dias, por exemplo) deixam a história meio boba.
“O Grande Golpe” (1956) é um filme noir sobre um roubo extremamente ousado a um hipódromo que, apesar de ser muito bem arquitetado, tem todos os requisitos pra dar errado. Tem a mulher fatal, tem a atmosfera de tensão, tem o anti-herói e tem o final surpreendente.
“Glória Feita de Sangue” (1957) é mais um filme de guerra que trazia uma crítica tão grande à Primeira Guerra Mundial que foi proibido de ser exibido na França, onde o filme se passa, por vários anos. Ele basicamente se divide em 2 atos: O primeiro é a guerra, quando um exército é enviado numa missão quase que suicida; e o segundo é o julgamento que se faz necessário, depois dessa missão. Um grande soco na boca do seu estômago saber que o filme foi baseado em fatos reais. Obra prima do Kubrick, na moral mesmo.
Anos 60:
“Spartacus” (1960) conta a história do gladiador Espártaco, que se junto com os outros gladiadores de seu Ludus e organizou uma rebelião contra Roma, que ficou conhecida como a “Guerra dos Gladiadores”. A história já foi adaptada inúmeras outras vezes e teve até uma famosa e ótima série de tv e essa adaptação de Kubrick, apesar de ter um final bem floreado e diferente da história original, é bem interessante. Só que não vou mentir, 198min é bem puxado.
“Lolita” (1962) é meio controverso. Apesar de não ser uma adaptação tão absurda quanto a de 1997 (que basicamente transformou um pedófilo nojento num cara apaixonado), também falha um pouco em deixar evidente o quão absurda é a relação entre o protagonista Humbert, do alto de seus 40 ~50 anos, com Dolores de apenas 12. Talvez a época e o fato da atriz aparentar ser um pouco mais velha tenha atrapalhado um pouco, mas a relação dos dois parece ser mais uma obsessão infrutífera do personagem principal.
“Dr. Fantástico” (1964) é bizarramente engraçado. Conta a história de um general que simplesmente surta e resolve declarar sozinho um ataque à URSS enviando vários aviões com bombas nucleares à Rússia e fazendo com que as autoridades americanas e soviéticas precisem se unir pra impedir o apocalipse iminente. O destaque fica pro ator Peter Sellers (o Inspetor Clouseau da primeira versão do filme A Pantera Cor-de-rosa, que inclusive foi indicado ao Globo de Ouro de ator coadjuvante por seu papel em Lolita) que interpretou 3 personagens diferentes no longa.
“2001: Uma Odisseia no Espaço” (1968) é um filme complexo que envolve muito do que as pessoas da época imaginavam que seria o mundo no século XXI. Se passa quase que totalmente no espaço e foi uma inovação para a ficção científica. A cena de abertura é uma das coisas mais primorosas que existe no cinema mundial. É um filme um tanto quanto confuso, e eu vou deixar que o Rafa fale por mim aqui nesse link da resenha maravilhosa dele
Anos 70:
“Laranja Mecânica” (1971) deve ser o filme mais famoso de Stanley Kubrick, muito por sua natureza violenta e chocante que o fez ser banido de vários países (inclusive do Brasil, no período da Ditadura). Conta a história de um grupo de jovens que simplesmente saem pelas ruas praticando atos de violência, até que o líder deles, Alex, é preso e se voluntaria para uma espécie de lavagem cerebral: O Método Ludovico. Nada mais falarei sobre esse filme… se você não o assistiu, assista AGORA
“Barry Lyndon” (1975) é outro filme de época que, honestamente, eu nem sabia que era do Kubrick. Não foi muito bem recepcionado pelo público, apesar de ser um filme muito bonito visualmente, com cenas gravadas apenas com a luz de velas (tá aí mais um motivo da lente caríssima da NASA que eu falei lá em cima). Conta a ascensão e declínio de Redmond Barry, um jovem camponês que consegue ascender socialmente durante e depois da Guerra dos Sete Anos através de golpes e de seus charmes. O ritmo é lento, mas a história é interessante. Só que já deixo avisado que tem 184min kkkkk
Anos 80:
“O Iluminado” (1980) é, de acordo com o próprio Stephen King, “Um lindo Cadillac sem motor”. Se você esquecer que ele é baseado num livro, ele é um filme impecável. Se você assistir sabendo que é adaptação literária, ele é bem fraco. Inclusive eu poderia escrever por horas, mas deixo vocês com esse texto e esse aqui.
“Nascido para Matar” (1987) é outro drama de guerra, dessa vez sobre a Guerra do Vietnã, e foi lançado pouco depois de Platoon, outro grande filme. Ele é dividido em 2 atos: a preparação do corpo de fuzileiros da marinha americana, extremamente desumana e lotada de violência verbal, física e moral; e a guerra em si, onde seguimos o soldado, agora tenente, Joker pelos campos do Vietnã e pelos horrores da guerra: os fuzileiros, que foram tão escorraçados em seu treinamento, agora praticam os atos desumanos com os vietnamitas.
Anos 90:
“De Olhos Bem Fechados” (1999) conta a história de Alice e Bill (interpretados por Nicole Kidman e Tom Cruise, o casal mais famoso de Hollywood à época) que enfrentam problemas conjugais após uma festa de Natal onde ambos acabam flertando com outras pessoas. Alice acredita ser algo apenas imaginário, enquanto Bill fica obcecado com a ideia de sua mulher nos braços de outra pessoa e acaba se envolvendo com uma sociedade secreta. Sim, é muito louco e não faz muito sentido, mas a química do casal que era real transparece pro filme e acaba sendo uma experiência interessante. Talvez com mais edição de Kubrick teria sido um filme mais coeso, já que ele infelizmente faleceu apenas alguns dias depois de exibir a primeira versão do filme para sua família e elenco. Uma pena ☹
Vou ficando por aqui, Geeks! Espero ter feito jus à memória do incrível Stanley Kubrick e que eu tenha conseguido despertar o interesse de vocês em alguns dos filmes descritos acima. Até mais!